Entrevista Clínica e Diagnóstico
Apesar da grande importância da entrevista clínica e de está
existir em todas as disciplinas da saúde mental, ainda é muito pequena a
quantidade de escritos a respeito.
Uma entrevista clínica tem muito em comum com uma interação
social, porém, se difere em alguns pontos fundamentais de outros tipos de
relacionamento. Na entrevista clínica a maioria das regras sociais de etiqueta
não são utilizadas, a conversa é predominantemente unidirecional e o
relacionamento é profissional. Outro aspecto que difere a entrevista clínica é
a delimitação do tempo, do lugar e da freqüência da interação.
Na entrevista clínica a maioria das informações obtidas pelo
terapeuta vem do relato do sujeito, porém é necessário que o terapeuta saiba
acrescentar a estas informações a observação clínica, os relatos adicionais de
pessoas significativas, registro sobre o caso, testagem psicológica e
entrevistas suplementares. De inicio é preciso que já fique estabelecido o
tempo que o paciente terá a sua disposição.
A entrevista clínica pode ser dividida em estruturadas e não
estruturadas. As entrevistas estruturadas incluem uma série de questões sobre
áreas definidas de conteúdo, já as entrevistas não estruturadas, são
encontradas mais facilmente nos settings clínicos. Geralmente, apesar de
não ter um formato rígido, ainda segue uma certa estrutura.
É preciso citar também a falta de valor que e dado ao setting
físico, que é importantíssimo em qualquer entrevista clínica. O estabelecimento
deve ser confortável. Bem mobiliado, Ter uma temperatura agradável e deve
conter todos os elementos necessários ao terapeuta. O ambiente deve ser calmo e
as interrupções evitadas ao máximo.
Existem vários tipos de entrevistas, caracterizadas pelo
objetivo em direção ao qual as entrevistas estão sendo conduzidas.
2.1 -
Entrevista de tomada de dados
Tem como objetivo geral obter informações preliminares sobre
um paciente, alguns outros objetivos mais específicos são: obter informações
suficientes para apresentar o caso em uma conferência clínica, clarificar a
natureza dos serviços que a instituição oferece ou a natureza do tratamento que
o paciente vai receber, comunicar as regras da instituição ao paciente,
determinar o tipo de tratamento e o terapeuta mais indicado para o paciente,
obter informações gerais para os registros da instituição e determinar a
indicação de recursos mais adequados. Esse tipo de entrevista se da geralmente
em instituições.
2.2 –
Entrevista da história de caso
Ocorrem geralmente na maioria das entrevistas clínicas. É uma
rica fonte de informações sobre o paciente e é conduzida com o propósito de a
natureza dos conflitos do paciente em sua história com o foco nos períodos
críticos antecedentes e desencadeantes. Histórias de caso podem ser obtidos
através da família e de amigos, além é claro do próprio paciente.
2.3 –
Entrevista do estado mental
É utilizada para determinar o grau de prejuízo mental
associado a condição clínica interligada. As áreas avaliadas são raciocínio,
pensamento, juízo, memória, concentração, fala, audição e percepção.
2.4 –
Entrevista de pré e pós-testagem
A entrevista antes da testagem são preferidas por alguns
psicólogos a fim de poder explicar ao paciente as razões do teste e seus
benefícios e discutir aspectos administrativos, local, hora e pagamento da
testagem. Quando a entrevista é
pós-testagem, o psicólogo já desenvolveu alguma hipótese com o resultado do
testagem, desejando explorá-los melhor com o paciente de modo a avaliar a
compreensão do paciente em relação a informação apresentada.
2.5-
Entrevista breve de avaliação
Caracteriza-se por um formato focal e de tempo limitado. O
terapeuta está interessado numa área específica e não considera outros
elementos da entrevista. Possui os seguintes propósitos: avaliar os riscos
imediatos de suicídio num paciente depressivo em crise, determinar a
necessidade da internação involuntária em hospital psiquiátrico, determinar se
o paciente poder ser tratado em regime ambulatorial, determinar se ele é apto
para prestar testemunho. A entrevista breve da avaliação é requerida por
encaminhamento sendo o paciente provavelmente submetido à entrevista clínica
tradicional.
2.6 –
Entrevista de desligamento
Ocorrem quando o paciente está concluindo um programa de
tratamento em regime de internação ou de ambulatório. O objetivo é conhecer o
ponto de vista do paciente em relação aos benefícios trazidos pelo tratamento,
examinar os planos para pós-alta ou trabalhar qualquer problema não resolvido
anteriores a alta ou ao término do tratamento.
2.7 –
Entrevista de pesquisa
É específico para a natureza da pesquisa desenvolvida. A
entrevista é realizada com a permissão do paciente que assina um documento
atestando seu consentimento.
A entrevista clínica se deve basicamente a motivação do
paciente em buscar tratamento, isso depende se ele veio voluntária ou
involuntariamente. Caso tenha vindo voluntariamente, provavelmente percebeu
algum problema e não conseguiu solucioná-lo com sua auto-ajuda, procurando
então a ajuda de um profissional. Os pacientes voluntários são mais fáceis de conseguir
informação e de estabelecer uma aliança terapêutica, pois tem a expectativa de
que terão seus problemas resolvidos com ajuda profissional. Já os pacientes que
não vem de forma espontânea são mais difíceis de fazer uma aliança terapêutica,
pois tem um nível de resistência maior. Cabe ao terapeuta trabalhar essa
resistência e conduzir a entrevista de modo que a tarefa clínica possa ser
realizada apesar da resistência.
Muitas vezes, mesmo pelo fato do paciente ter vindo
voluntariamente não significa que ele não possa Ter alguma resistência frente a
motivos não revelados, essa resistência acaba comprometendo a pureza da
entrevista clínica. Por isso cabe ao terapeuta descobrir os verdadeiros motivos
do paciente pela terapia, pois esses intervirão não apenas na entrevista como
em futuras tentativas de intervenções.
A expectativa é outro item que influencia a entrevista. Pois
muitas vezes se tem visão errada de um atendimento terapêutico levado a uma
expectativa que não condiz com o real. É importante então que pergunte-se ao
paciente o que ele acha que vai ser feito na entrevista e que a razão desta a
fim de clarear as idéias para o paciente.
A percepção do paciente pelo terapeuta também influencia na
entrevista. Muitas vezes a visão que o paciente tem do terapeuta pode afetar
todo o processo clínico. Por isso é importante que o terapeuta compreenda se
tais percepções existem e se influenciam a interação dinâmica entre o paciente
e terapeuta durante o processo de entrevista.
Todos estes itens citados acima são importantes pois
influenciam a maneira como o paciente vai se conduzir na entrevista.
O primeiro fator que influencia a abordagem do terapeuta na
entrevista é a sua orientação filosófica. Raramente o terapeuta começa a
entrevista com o quadro em branco. Os terapeutas possuem uma estrutura teórica
que define as áreas de investigação, o método de investigação, suas avaliações
e objetivos. Em uma perspectiva de sistema família/entrevista é bem diferente
da entrevista de orientação comportamental.
Valores e crenças pessoais são o segundo fator que determina
a abordagem do terapeuta na entrevista. A relação das técnicas que serão
utilizadas é realizada à partir da sua orientação filosófica e de seus valores
e crenças pessoais. Enquanto um terapeuta pode valorizar muito a expressão de
sentimentos outro pode valorizar a disposição para a introspecção ou ainda o
desejo de investigar antecedentes e conseqüências do comportamento.
Ao final da entrevista clínica o terapeuta já fez algumas
avaliações, tanto sobre o problema como sobre o paciente. Com base nessa
avaliação são definidos os objetivos e os métodos de tratamento.
Sua orientação filosófica geralmente determina quais delas
eles utilizarão mais e o grau de ênfase atribuído a determinada técnica, mas em
verdade, tais técnicas todas são a base do processo de entrevista.
Essas técnicas incluem o questionamento direto, a reflexão, a
reexposição (paráfrase: colocar em palavras que possibilitem uma melhor
compreensão), o esclarecimento, a confrontação, a auto-revelação, o silêncio, a
explicação, a “reframing” (restruturação cognitiva), a interpretação e o
humor.
Questionamento: Esta é a técnica mais
freqüentemente empregada pelos entrevistadores clínicos. O questionamento pode
ser tanto direto como em aberto.
Reflexão: Essa técnica requer que o
entrevistador tenha habilidade de reproduzir o material cognitivo ou emocional
do paciente, de modo a mostrar-lhe que seus sentimentos ou declarações foram
compreendidas. O emprego excessivo da reflexão em uma entrevista é
contraproducente, porque muitas áreas importantes são deixadas de lado.
Reexposição (Paráfrase): A reexposição
simplesmente coloca em outras palavras, de maneira mais clara e articulada, o
que o paciente diz. A reexposição é em geral empregada para facilitar a
compreensão e para esclarecer, enquanto a reflexão e utilizada como uma
intervenção terapêutica.
Clarificação: A clarificação geralmente se faz
pela utilização de alguma das outras técnicas (questionamento, paráfrase ou
reexposição), mas o seu propósito é auxiliar o paciente a compreender o que é
dito na entrevista.
Confrontação: A confrontação é a técnica através
da qual o terapeuta aponta discrepâncias entre o que é observado e o que é
falado. Às vezes ela é empregada quando o paciente diz alguma coisa diferente
daquilo que o terapeuta está percebendo dele. A confrontação é freqüentemente
utilizada com drogados e outros pacientes com transtornos de caráter, a fim de
desfazer suas negações e defesas rígidas. Ela em geral produz o efeito de
aumentar a ansiedade e desencadear a negação e a evitação que ela buscava
atingir.
A confrontação pode ser construtiva ou destrutiva, quando mal
utilizada ela pode ser maléfica; deve ser utilizada por terapeutas experientes.
Auto-revelação: Através desta técnica, o
terapeuta transmite ao paciente suas experiências pessoais ou sentimentos. A
auto-revelação por parte do terapeuta facilita a auto-revelação do paciente.
Porém, esta técnica deve ser empregada com moderação porque pode provocar uma
falsa expectativa no paciente. O terapeuta precisa ser criterioso ao determinar
quais informações devem ser reveladas, bem como seu possível efeito no
paciente.
Silêncio: O silêncio pode ser uma técnica
de entrevista e um artifício terapêutico que proporciona ao paciente uma
oportunidade de processar e compreender o que foi dito, encaminhando a
entrevista, assim, em direção positiva. O paciente deve compreender o motivo do
silêncio porque geralmente visa facilitar a introspecção ou permite ao paciente
reassimilar suas emoções depois de liberá-las.
Exploração: Através desta técnica é possível
a investigação de áreas da vida do paciente que requerem um exame mais
profundo. Também pode ser empregada para determinar o grau de insight do
paciente, e o quanto ele precisa ser pressionado para que possa experienciar um
dado sentimento. Os terapeutas não devem ter medo de explorar certas áreas, mesmo
que elas possam ser encaradas como delicadas.
Reframing (Reestruturação cognitiva):
Esta técnica faz com que o paciente e o terapeuta reafirmem suas crenças,
atitudes ou sentimentos de maneira mais realista, proporcionando uma
perspectiva nova de uma situação e servindo para desfazer afirmações negativas.
Esta técnica pode levar a mudanças no comportamento e embora seja eficaz, ele
não dispensa a prática e o desenvolvimento das habilidades do terapeuta, de
modo que pode alcançar sua eficácia total.
Interpretação: Através desta técnica, o
terapeuta oferece informações de um modo que permite ao paciente explorar seu
comportamento e compreender sua motivação. Esta técnica é a mais difícil de ser
alcançada, porque implica no domínio amplo da teoria da personalidade e
motivação, acompanhada de experiências supervisionada. A maioria dos
terapeutas, usa a interpretação de uma forma ou outra. Alguns confiam nela
muito mais do que nas demais e os pacientes podem simplesmente aceitar as
afirmações do terapeuta, acreditando em sua experiência, sabedoria e
autoridade. Por esta razão, devemos ser criteriosos e cuidadosos ao fornecer
interpretações.
Humor: A compreensão do papel do humor na avaliação clínica
é recente. Porém, o humor pode reduzir a ansiedade, facilitar o movimento
terapêutico e enriquecer a entrevista. Uma confiança excessiva nesta abordagem
dará ao paciente a impressão de que o terapeuta não está levando a sério a
entrevista. Portanto, o humor deve ser empregado moderadamente com o propósito
básico de beneficiar o paciente.
Os terapeutas trazem consigo um conjunto de características
pessoais que é considerado mais importante do que qualquer técnica de método teórico.
Uma boa entrevista clínica desenvolve-se em fases controladas
pelo terapeuta.
Sellivan caracterizou a entrevista como uma seqüência de
fases classificando como: início formal, reconhecimento, investigação detalhada
e término.
Benjamin divide a entrevista em 3 estágios: início ou
apresentação do problema, seguido pelo desenvolvimento e o encerramento.
Kanfer e Scheff dividem em estruturação dos papéis, formação
da aliança terapêutica, desenvolvimento do comprometimento com a mudança,
análise do comportamento, discussão dos objetivos do tratamento e planejamento.
Para Rogers o paciente vem em busca de ajuda, a situação é
definida, e através da aceitação, clarificação e da expressão de sentimentos
positivos, ocorre o desenvolvimento do insight.
Há estágios na entrevista em que a maioria dos terapeutas
concordam. Primeiro há a introdução, a qual tem como tarefa principal o
desenvolvimento do rapport e o estabelecimento da confiança. Em segundo
lugar, há a exploração, a qual irá formar uma hipótese que justifique os fatos
principais do caso.
O terceiro é o teste da hipótese. O quarto estágio é
oferecido o feed back, onde o terapeuta revela ao paciente os pontos mais
importantes da avaliação. E a fase final é o término, onde a tarefa é
desenvolver um plano de tratamento adequado a objetivos sobre os quais há
concordância mutua.
A natureza desta interação foi enfatizada por algumas orientações
e minimizada por outras. Os rogerianos admitem que a transferência se faz porém
não que ela seja um aspecto importante no tratamento. Já os behavioristas
acreditam que o relacionamento entre paciente e terapeuta é importante na
medida em que facilita o desenvolvimento de estratégias comportamentais.
Diz respeito ao término, que é o último estágio. É comum a
entrevista ser encerrada abruptamente, sem um sinal e sem que sejam
consideradas importantes informações clínicas que podem ser obtidas nos últimos
minutos.
Porém ela deve ser dedicada a redução da intensidade
emocional do paciente e assegurar-se de que todas as informações importantes
foram apresentadas.